sábado, 31 de março de 2018

Meditação para o Domingo de Páscoa

Pe João Mendes S.J

     Os homens todos andam em busca de alegria, e tão poucos encontram! Porque tem medo ao risco de ir buscar onde ele está: do outro lado do sofrimento. Eis aí a divina aventura do cristão, a seríssima empresa da sua vida.
     É assim a alegria pascal: fruto da dor, alegria redimida, paz onde se encontram a pureza de alma e o amor verdadeiro. A grande festa do cristianismo, A Páscoa é a festa da alegria, mas da alegria purificada na verdade da vida, no grande encontro com Deus. " A alegria é a coisa mais séria deste mundo" disse o artista português ( Almada Negreiros). E, realmente, é num Domingo da Ressurreição, que melhor vemos e sentimos a razão dessas palavras.
     
1. O CRISTIANISMO É ALEGRIA...


     1. Porque é participação na vida de Deus, e essa vida é gloriosa. Ser cristão é escolher a eternidade, e vencer a morte. No batismo pedimos a vida eterna à porta da Igreja, começamos a ser divinos; e as nossas ações daí em diante serão humano-divinas, gloriosas portanto. É que a graça não é só um direito, e já um princípio; são as arras da glória eterna, a posse de Deus e do Céu, se bem que ainda às escuras na penumbra da fé, e nos domínios da dor e da morte. Daí o aspecto do alheamento e estranheza que o mundo sente diante do cristão convicto. É que escolheu a eternidade, renunciando aos prestígios do tempo. Tem que ser considerado estrangeiro.
     2. Porque tudo na vida cristã pode ser triunfo. Todas as dores e fracassos se podem transformar em vida divina. O Sangue de Cristo, derramado para redenção nossa, é realmente o elixir da eterna juventude que tão buscado foi pelos alquimistas antigos. Todos os fracassos e destinos falhados, até a ruína, transfigurados em valores divinos. E, se a vida só pode ter sentido e sabor, quando se desvanecer o aspecto da morte, nesse caso, ninguém mais desafogado e livre da fatalidade que o cristão. E foi esse sentimento de liberdade de espírito, diante de todas as fatalidades do mundo antigo, o que sentiram as primeiras gerações de seguidores de Cristo: desafogo perante o destino, pela decifração do absurdo.

2. MAS ALEGRIA CONQUISTADA

     1. Não é fácil a alegria cristã: não é nenhum dom gratuito que me seja entregue como a um príncipe privilegiado é entregue uma herança real. Tenho de a conquistar. E é esta a mais bela e mais gloriosa empresa da minha vida. A terrível seriedade da nossa alegria de cristãos, vem de que a participação na vida gloriosa de Deus é obtida mediante uma participação na Paixão de Cristo. A primitiva cerimônia do batismo por imersão era a sepultura do homem velho, da qual sairemos ressuscitados, juntamente com Cristo, para vivermos a novidade da vida cristã.

     2. Portanto, ser cristão é ser homem novo, resgatado e restaurado. É manter na alma o rejuvenescimento da primavera depois do inverno, da novidade depois da ruina, da verdade depois da mentira. É uma paz, ou satisfação das aspirações essenciais, em perpétua construção e conquista, com sabor de vitória.
     Mas, para ter paz no coração, aquela paz de Deus que ultrapassa todo o sentido, é preciso manter a verdade da vida, numa longa e continuada fidelidade. É o que nos pede S. Paulo na Epístola da missa de Hoje: " purificai-vos do velho fermento, para que sejais massa nova, uma vez que sois ázimos. Não foi Cristo imolado, ele é nossa Páscoa? E assim, banqueteemo-nos, não com o fermento velho, nem com o fermento da malícia e da corrupção, mas com os ázimos da sinceridade e da verdade. A nossa alegria é, pois, um gozo redimido nos sofrimentos de Cristo, uma luz de pureza e autenticidade, isenção do que é velho, mundano, e mentiroso, ázimos de sinceridade e de verdade.

CONCLUSÕES

     1. A vaidade de ser triste, tão comum aos românticos, e a todos os homens na medida em que todos temos alguma coisa de romântico, essa maneira de se propor como excepcional pelo sofrimento, é um dos estados de alma menos cristãos. Se tudo, na vida do discípulo de Cristo, é triunfo, e triunfo para a eternidade, como poderá ele comprazer-se de tristeza? Os homens excepcionais não tem fatalmente um destino heróico da tragédia, como queria o paganismo antigo; mas são aqueles que chegam à simplicidade e à humildade de sempre se julgarem felizes. O soberbo é trágico porque julga que todo o êxito lhe é devido, e o humilde é alegre, porque aceita a vida e os acontecimentos.
     2. As ascensões do coração. Depois dum bem alcançado é preciso procurar outro maior, porque só assim rejuvenesce a alegria, e vai caindo o que é velho. O motivo porque tantos, no princípio da conversão, vivem felizes, e depois perdem o gosto e a paz de Deus, é porque deixaram cansar o amor na rotina dos bens iguais; ou por outra: porque deixaram de tender so bem maior e de morrer ao que é pequeno. Para ser feliz é preciso renovar-se continuamente, com um ideal e uma doação sempre novos. Daí que conquistar a alegria seja o mesmo que conquistar a perfeição: ir subindo sempre a montanha cujos cimos vão sempre fugindo. E não se cansar, nem desistir da subida. Porque a alegria, com perfeição, não tem nível certo, ou altura marcada. É uma pureza, gozosa mas instável, que se vai criando, em altitudes, cada vez mais elevadas. Só assim seremos ázimos de sinceridade e verdade, repassados de Deus e de sua Luz beatificante.

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